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segunda-feira, 9 de julho de 2012

Elitismos, privilégios e o leite de pera

Parte da academia não leva fé na luta de classes, joga pela janela, ignora finge que não vê. Acha que Marx não presta pra muita coisa, etc. 

Não são poucos, nem estão errados de per si. Eu mesmo não dou muita trela pra Foucault, acho que apesar de ter enormes contribuições, não me responde questões colocadas pela situação do negro no Brasil no período da escravidão, por exemplo, se entendermos este negro como mais que um arquétipo de pessoa, como mais que um objeto distante e assexuado, que não se relaciona com o opressor e mantém relações de reprodução de opressão, por exemplo, com seus "iguais".

Da mesma forma tenho dificuldades de entender a utilização de Marx no plano das micro-relações, no plano da cultura também em alguns momentos e procuro respostas que vêm me agradando  em Thompson, João José Reis, Eduardo Silva, Ginzburg, entre outros. 

O fato é que existem muitos autores que explicam muita coisa sobre o mundo, cada um na sua razão, e muitos leitores que se identificam com cada um de acordo com o tipo de ferramental teórico que cabe em seu plano de pesquisa e discussão. 

Isso é o que torna bacana o mundo da academia e do pensamento, o entendimento que existem mais problemas que respostas no real e se opta (sim, se opta) por um viés de explicação deste real obedecendo a posições ideológicas, culturais, de classe, etc. Essa opção tende a ser política sim, e é clara no discurso inclusive científico dos pesquisadores, cientistas sociais, antropólogos, sociólogos.

Sob o ponto de vista que entendo como o adequado para a explicação do real não abro mão de Marx, é parte fundamental da minha percepção do mundo e parte fundamental de minha noção inclusive da cultura, com a devida vênia a Thompson que introduziu uma nova percepção do Marxismo nesta cabecita que gasta dedos aqui.

Entendo que outros não coloquem nem como cabível a noção de luta de classes, um de meus melhores amigos e pesquisador que muito respeito não leva muita fé neste conceito, outros tantos se colocam como ariscos ao conceito de luta de classes se este for um empecilho para os ganhos imediatos que os mais pobres obtiverem via ação dos governos.

Repito: São opções que não tornam anátema a negação de um conceito ou a opção por uma escola x ou y de explicação do real, isso inclusive faz rico o debate e faz o real ser tão bem explicado seja por Marx, por Foucault, por Levi-Strauss, cada um a seu jeito, cada um com sua ferramenta.

O problema é quando Marx, Engels, Foucault, Freud ou Tonico e Tinoco são usados para refletir, expandir, explicar e embasar falsamente o simples e belo preconceito de classe e cultural. Quando utilizam um discurso proto-acadêmico para justificar que greve é privilégio ou que o feminismo não tem em si a questão de classe é que a situation fica black.

O direito de greve, e de toda categoria, quando é retirado de uma delas por estar de alguma forma não alinhado com o proletariado ou com quem se considera "ter a permissão" de parar de trabalhar pra conquistar melhorias em sua vida é simplesmente entender que a divisão de classes se dá por sua posição social no plano da aparência. Ou seja, se define classe pela origem salarial e não pela posse ou não de meios de controlar economicamente a sociedade ou o sistema.

Considera-se que existem trabalhadores que por ganharem mais são impedidos de buscarem melhorias salariais ou estruturais para seu local de trabalho por não serem miseráveis, ou seja, o sujeito que estudou ao ponto de ser doutor não pode protestar e exigir reposição de um salário que não recebe reajuste há quase dez anos ou estrutura para universidades sucateadas por ser "privilegiado" pelo salário acima do da maioria das pessoas.

A crítica aí feita é pela não hierarquização entre trabalho intelectual e braçal, por exemplo, mas ataca não a estrutura social que se ergue com base nisso, mas a ponta que é o trabalhador que vende sua força de trabalho por um determinado preço e vê este valor não ser reajustado, ou seja, opta-se não por atacar uma base estrutural que hierarquiza o trabalho e oprime, mas um dos alvos da opressão, mesmo que minorada, ou seja, ao invés de atacar a exploração do capital ataca-se o trabalhador.

Esse tipo de lógica é comum em parte da elite que se identifica como "crítica" e "progressista" por tomar posicionamentos liberais com relação a gênero, raça, orientação sexual, mas mal esconde o incômodo quando a posição de classe é ameaçada por algum tipo de comportamento que defina transformação e superação do que diz combater, os tais privilégios.

Por isso também a lógica da greve ser um privilégio para determinados tipos de trabalhadores que não estão expostos à exploração" e por isso não tem razão para lutar contra o sistema, ou seja, a exploração para determinado tipo de pessoas, por ser minorada pela posição social, se extingue e por isso a questão de classe é negada, não por algum viés explicativo do real que tenha abolido a categoria, mas por uma percepção impressionista da ausência de opressão a partir dos privilégios de classe que se tem a disposição.

Por não sofrer toda a gama de opressão que um proletário não qualificado que ganham  salário mínimo sofre, um acadêmico, na visão de certa ala da academia, não é explorado, embora não controle nenhum tipo de meio de produção e  venda sua força de trabalho a preços que não obtém reajustes e sob condições nada suficientes para o exercício de sua função.

Na carona desta visão a mulher de classe média alta por vezes não sofre opressão, fora a sexista, e por ter um trabalho mais "importante" não pode abrir mão do trabalho de mulheres pobres, em geral negras, que "precisam do trabalho" para sobreviver. 

A questão de classe permeia todo o discurso, que pode ganhar aqui e ali um apanhado de autores, seja Foucault, seja Deleuze, seja Levi-Strauss, Freud, o que estiver a mão e justifique o injustificável, que por vezes é também posto como uma "percepção que supera a dicotomia de classes anacrônica defendida por Marx".

Não é um discurso de uma pessoa ou outra, mas é muitas vezes um modus operandi de parte da classe média que ocupa a academia e entende que ações coletivas e políticas diretas não são imprescindíveis diante de mudanças que podem ser feitas no discurso, por exemplo ou em uma nova "perspectiva" diante de classes, etnias, orientação sexual, transgênero ou gênero. 

Esta forma de pensar muitas vezes é menos embasada me diferenças teóricas de pulso (é bom lembrar que parte do discurso de Levi-Strauss por exemplo tinha referência em Marx e que Foucault não uma ou duas vezes foi enfático defensor do conceito de luta de classes, embora discordasse dos marxistas em muito) e mais obedecem a uma postura ou política ou social que combate determinados tipos de ação política, muitas vezes conectada a uma certa aversão à militância, que transcende à acomodação e moderação social ou que enxerga que a estrutura do estado/sociedade não é apenas uma ilusão que pode ser transformada por um enorme abraço na lagoa.

É importante discernir que o discurso elitista é muitas vezes oculto em posturas que parecem acadêmicas e científicas ou de algum tipo de escola de pensamento específica, tentando se esconder no mito da "imparcialidade da ciência" e muitas vezes nas solicitações para que o interlocutor, tido como inepto, leia mais, o que se oculta é a ausência de vinculo entre o que se propõe científico e o que é apenas aquela defesa de privilégio clara e velha de guerra.

Por isso quando alguém atacar a luta de classes como conceito e o direito de greve for chamado de privilégio, pense bem se o autor da colocação com seus rococós, frases e autores não está apenas fazendo defesa de seus próprios privilégios de alguma forma ameaçado por trabalhadores que combatem a exploração pela via da greve. 

Da mesma forma determinadas "ironias" para com marxistas por vezes tem menos ligação com críticas científicas e mais questões partidárias sobrevoando.

O Leite de Pera que habita determinados círculos acadêmicos chama de privilégio o que é luta por considerar que não fica bem gente estudada com pé no chão.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Lusamérica Latim em Pó

Língua, esta mesma, língua. Aquela que na boca vira verso, vira palavra, vira ócio, vira slogan, vira nada.

Não, não errei de blog, não fiquei maluco, só tô falando da língua, essa ferramentinha do diabo que nos ajuda à comunicação e também à demarcação de posições políticas claras ou não.

A língua é o meio mais comum e simples de comunicação,ele é absorvido pelos falantes logo nos primeiros anos de vida e é marca de cultura, classe, região e formação intelectual.

Na maior parte de nossa vida na escola aprendemos a língua através da tal Norma Culta, e também o Inglês e/ou o Espanhol como língua auxiliar obrigatória "em tempos de globalização". 

Na escola também temos como política determinante do ensino da língua o corte que relaciona ao falar epítetos como o "certo" e o "errado". Falar "certo" é o falar conforme determina a norma culta e falar "errado" é a fala nativa, a aprendida na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê.

A escola ai atua como mediadora da casa para a sociedade, ou seja, grosso modo o aluno sai bonitinho da família e adentra o espaço que o "treina" para a sociedade. 

Este "treinamento" obedece, claro, uma lógica de estratificação que é lindamente aplicada com a diferenciação do tipo e qualidade do ensino de acordo com a classe a quem ele atinge. Escolas públicas em geral hoje tem uma qualidade de ensino pior que escolas particulares e dentre ambas existem gradações relacionadas a onde se localizam e ao valor pago pelo "produto" ensino.

Essa estratificação é de simples entendimento ao olharmos, de novo, para a aplicação da tal língua pelo aluno e também pelo domínio de línguas estrangeiras. Dá pra saber quem tem um tipo de ensino com maior atenção ao aprendizado pelo modo pelo qual o aluno escreve e domina a leitura.

Mas não só na escola isso ocorre. A Língua é uma barreira inclusive sob o ponto de vista das relações diretas entre indivíduos e entre classes. Não é incomum que conversas sejam colocadas baseadas em jargões cujo entendimento é limitado a "iniciados" com o fim de reduzir mesmo o entendimento por outrem. Isso ocorrem em situações prosaicas do cotidiano e como arma de classe ou de reserva de mercado, o vocabulário jurídico e a linguagem cientifica acadêmica tão aí pra não nos deixa mentir.

Um dos mais interessantes argumentos quando são apontadas as barreiras linguistas, sejam elas de não entendimento de termos ou de uma língua estrangeira, é que o interlocutor é "preguiçoso". Esse argumento chega a ser fofo, mesmo, porque ele aponta que o defeito de um texto ou discurso em não ser entendido não é o do autor, mas o das pessoas que não o entendem,mesmo quando estas são a maioria.

Assim se mantém um locus social, uma estratificação social via negação do entendimento ao outro do falado, do escrito, se exclui que não possui o mesmo "grau" de entendimento do autor, que por vezes é só um embusteiro enfiado em barrocos, rococós e termos em inglês ou francês que possuem similares na língua nativa dos "preguiçosos".

A diferença entre os embusteiros e os defensores da elite de forma clara? Talvez coragem.

E ai nos peguntamos (nós cuja a língua é pátria e temos mátria, mas queremos frátria) o que quer e o que pode essa língua?


terça-feira, 28 de junho de 2011

A Classe Operária vai à Padaria

No texto anterior tento discutir a questão da chamada política 2.0 e menciono uma galera que não tá no mundão 2.0, mas tá no dia a dia e é alvo de politicas,. Assunto de políticas e personagem principal de discussões, algumas que querem trocar de povo, inclusive são,de forma indireta, atacados quando genericamente as pessoas se referem pejorativamente a evangélicos, católicos, burros, pobres,entre outros substantivos e adjetivos nem sempre de bom tom.

Mas o que é esse povo, o que é essa classe operária, porque é tão difícil entender o que ela quer e porque é tão difícil que nossa discussão fofa e lindona sobre ativismo digital e praça Tahrir, política 2.0 e assuntos críticos como a questão de gênero e LGBTT seja uma discussão que vá além da pequena e isolada aldeia da virtualidade? Talvez porque fazemos da virtualidade um bantustão de ideologia avant garde.

A classe operária quando invade a virtualidade quase nunca se parece com nossas amizades descoladas que se junta a nós na defesa do fim do machismo e da homofobia. E isso não ocorre porque ela é burra e desentendida, mas porque ela não é convencida, não nos recebe em sua casa pra tomar café e nem é ouvida em diálogos francos sobre os assuntos. Uma moça outro dia foi tida como heroína da raça por, de forma bem simples, colocar questões hiper fodas em uma passeata homofóbica de fundamentalistas cristãos. Virou ídolo fácil e automático da galera hype da Internet. Mas no dia seguinte ela, como todos os iguais a ela, foi incluída nos diversos xingamentos aos "evangélicos", essa espécie parecida com povo, despersonalizada e amorfa. Dona Jovelina é evangélica, como muitos outros e outras.

A virtualidade, conhecida nos lugares mais legais do planeta como política 2.0, também acha que o povo vota no Bolsonaro porque é ignorante e tudo fascista, e acha que é o fim da picada eleger Tiririca. Fico me perguntando como a gente faz então pra inverter a demanda de base de esquerda, e não de partidos de esquerda necessariamente, no congresso. Se o povo é esse ai e ele vota no Tiririca e no Bolsonaro e não no Rui Kureda, companheiro socialista bom pra diabo , não era com ele que a gente tinha de ir lá e dialogar? Adianta a gente fazer marcha pela paz, pela maconha, pelo direito de voar de costas ou pelo tetra do Flusão se essa marcha for feita apenas por milhares de modernos jovens que em sua maioria nem sequer lembram o nosso amado amigão porteiro ou padeiro? Nossa Praça Tahrir teria povo ou apenas uma classe média descolada, pós moderna e cheia de amor pra dar?

Essas perguntas não querem em momento algum desqualificar qualquer movimento ou pensamento e nem botar gasolina na falsa dicotomia de que ter o povo a nosso lado a qualquer custo é o mote, reduzindo obviamente povo a voto.O que eu quero é propor o debate sobre que politica fazemos cujo 2.0 reproduz o preconceito contra a população que vai à padaria, construindo um muro onde nós, os iluminados, levamos o conhecimento, o movimento, a verdade e a vida a um bando de gente estúpida que recebe bolsa família.

Discorremos sobre o voto "consciente" em deputados de esquerda e não somos capazes de aceitar e compreender que o voto no João da Pipoca, que faz benfeitorias no bairro do cabra, ou no Zeca do Tijolo, que doou tijolo pra o cara terminar a casa dele que estava quase sem teto, com goteira e estragando seus parcos bens, como votos conscientes, completamente entendidos. Cobramos uma ideia de "civilidade" e uma relação com a sociedade que contemple um dever para com uma sociedade que na maioria dos casos nunca cumpriu dever algum com as pessoas de classes para além túnel rebouças, por exemplo, os tais pobres.

Cobramos uma consciência da população, que já há, mas temos nós consciência do que ocorre, do que é a vida diária de um povo que em geral toma porrada, perde a casa e só pode confiar realmente na sua rede de relações criadas a partir do parentesco, dos laços de amizade, dos políticos locais, que ajudam essas amizades e laços? Dificilmente. Às vezes nossa classe "consciente" parece entender mais os Nuer ou o cálculo da mais valia do operário da Volks no Cazaquistão do que a classe operária que ele quer levar ao paraíso, mas só se for de acordo com suas regras.

A esquerda, essa mesmo que se propõe porta-voz da classe operária,  faz algum tipo de esforço para ir na classe operária, entendê-la, ouvi-la, sê-la, participar dos laços, ser contra-hegemônica no seu dia a dia, dialogar na padaria? E este esforço vai além do aceno simpático, do abraço, da conversa cujo teor está impregnado do desejo de iluminar mentes e menos de compreender o intrincado sistema de classificação baseado em honra, em compadrio? A classe operária gostava do Brizola por ele ser um "líder carismático" ou por ele honrar o desejo das massas e ser confiável à elas?  O Carisma do cara vinha de sua fala e magnetismo ou da percepção da galera que ele ia cumprir, e energicamente se preciso, os compromissos assumidos com ela "na palavra". Lula é carismático por ser carismático ou por ser um de nós, mais um nessa vida e um que tava lá em cima e olhou pra baixo, não cuspiu no prato que comeu. Esse tipo de relação não é simples, não é fácil, não é jogo e ninguém nela é estúpido. Sabemos tudo sobre a formação da classe operária inglesa, e da nossa? E como saber? Formatando-a em conceitos genéricos e internacionalistas que jamais fogem de modelos que quase obrigam a  comportamentos idênticos entre ingleses e Baianos?

Gritamos alto sobre a cassação de direitos dos homossexuais e recuos nos avanços disponíveis, mas disputamos a hegemonia do debate com o povo da padaria? Vamos lá e conversamos com os caras? dizemos pra eles que médicos do mundo inteiro pesquisaram e sabem que gay não é safadeza? Dizem os pra eles que o casamento é um troço que deve valer pra todo mundo, mas não o da igreja, o do cartório? Procuramos ver e ouvir que existem gays mais respeitados na favela, no bairro  e no sertão baiano do que na paulista? Sabemos e discutimos as diferenças entre a homofobia da Paulista e certos medos de que tradições sejam esculhambadas por "modernidades" trazidas por gente que é de outro mundo pra eles, e em geral é de um mundo que grila suas terras e passa o trator em suas comunidades? Quando vivemos em um mundo onde ateus reivindicam o direito de desqualificar quem não é ateu, acho que não.

Qualquer se humano atento a software sabe que pra se ter um 2.0 precisamos antes viabilizar o modelo 1.0 ou talvez caiamos no erro de abandonar o esqueleto anterior sem um futuro estar pronto. Enquanto isso nossos amigos fascistas tão lá compreendendo entendendo, conversando e tomando café.

É importante usarmos todas as ferramentas, digitais ou não, de atuação, mas temos de saber fazer política com a moçada 2.0 e com a classe operária, que não vai ao Facebook, mas vai na padaria.