domingo, 29 de abril de 2012

A felicidade vai desabar sobre os homens

O excesso de felicidade me cansa, muito. A felicidade como valor supremo formatado e mecânico me cansa. A felicidade como "fofura" poliana de ver tudo pelo lado positivo me cansa.

E não, não é por um mau humor atávico ou pelo mantra de que isso "aliena", é pelo fato clássico que isso é infantil, tolo, é uma fuga deprimida do real e é a perda do real como valor, como concretude e como medida de felicidade, ela mesma, concreta, gostosa, quente, úmida e pulsante.

A felicidade ditatorial "ursinhos carinhosos, vamos sorrir eternamente" não existe. Esse mundo pônei maldito róseo,e ternamente planejado por fadas madrinhas para construir calçadas de ouro pro mundo de Oz é basófia, é blabláblá, é fantasia é conto de fadas.

Atribuir a Quintana, Caio Fernando Abreu ou Clarisse Lispector frases positivas que não são de sua autoria e que vão na contra-mão de suas obras. 

Trocar versos em uma poesia de Quintana como "A vida continua indiferente" para "Só se deve morrer de puro amor!" do poema Nunca (Mario Quintana In: A Cor do Invisível, Mario Quintana - Poesia completa, Editora Nova Aguilar, p. 882) é simplesmente  falsear o real, flexionar a autoria da realidade para uma outra onde qualquer adversidade se torna um impensável padrão mecânico de lidar com problemas. 

Falsos Quintanas mudam a poesia e sua arte, sua construção e indicam que a realidade só pode ter o destino da felicidade absurda e utópica da história da mamãe na beira da cama.

Não se permite a derrota, não se permite a falha, o mutante, o outro, o adverso. Não se permite o aprender com o murro, o sofrimento. E tome Valium!

Tudo é obrigatoriamente terminado em dóceis e mansas versões publicitárias de uma radiante felicidade de subúrbio Americano.

E sigamos na infantil vontade de viver a vida inventada dos outros a ponto e negar ao passado sua própria vida e história e visões diferentes de felicidade dando a autores ácidos, irônicos o dom de tornarem-se Paulos coelhos póstumos.

Permitam-se a Tabacaria , por gentileza! Tirem essa fofura do caminho que eu quero passear com meu horror!

Olhem ao redor, vejam as flores, o sol, a praia, os caminhos e ruas, mas vejam o horror, vejam e aprendam a dor, a dor de dente, a humilhação, o ódio, a falha, permitam-se crianças, permitam-se!

Parem de impôr até a outrem suas ânsias e fantasias infantis! Parem de impor sue medo do concreto e do entendimento entre o horror e o belo por um medo do terror, da feiúra, do que não é róseo, binário!  Permitam-se a fuga da ignorância!

Saber não é acumular, saber é enxergar e para tal é preciso olhar, sem mudar de foco, sem desenhar por sobre os muros cinzas jardins de flores que não estão lá acreditando que  o muro colorido é um jardim de flores.

O muro não se torna jardim, embora seja um belo muro.

O mundo não tem redenção obrigatória, o bem nem sempre vence o mal, nem sempre sorrimos no final. A vida não é filme,você não entendeu! A vida no máximo é um filme profundamente denso, em tudo, até nos risos.

Que a felicidade de cada um tenha o direito de chorar e de não rir e de ser efusiva, ou silenciosa, ou cinza. 

Ser feliz é um ato político.

O Sorriso é um ato político, não o deixem ser um sorriso impotente!







3 comentários:

  1. Bueno, gostei demais do texto. Concordo com quase tudo e enquanto lia, troska que ainda sou (confesso), lembrei de uma frase clássica do Trotsky que tem tudo a ver com o sentido do teu texto:
    "Vejo uma a larga faixa verde de grama sob o muro, sobre ele o claro céu azul e a luz do sol por todos os lados. A vida é bela, que as gerações futuras a limpem de todo o mal, de toda opressão, de toda violência e a gozem plenamente.”
    Rá!!!

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  2. Adorei o texto. Disse tudo o que gostaria de dizer sobre essa mania babaca das postagenzinhas cheias de palavrinhas docinhas e sentimentos idem. Ursinhos, florezinhas e borboletas. Amorezinhos, conselhinhos eajudinhas...E o horror dos horrores: falsas atribuições a Pessoa, Quintana, Clarice, Drummond, Lincoln, Shakespeare, Bukwski... Enfim, lavei a alma, por momentos. Obrigada.

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